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Até quando as agências reguladoras fecharão os olhos para a gravidade do consumo de agrotóxicos?

Anvisa afirma que, para reduzir os resíduos de agrotóxicos, basta lavar a casca do alimento com água e escovinha.

Dia 3/12 é comemorado o Dia Mundial de Luta contra os Agrotóxicos. Em recente declaração, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), afirmou que há “segurança alimentar aceitável” nos alimentos analisados no relatório Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA), divulgado no último dia 25. Essa afirmação causou grande impacto para estudiosos que desacreditam dos critérios de avaliação da Anvisa frente ao grave problema de saúde pública que o consumo de agrotóxicos causa para a população, quanto em entidades que lutam pelo fim do uso de agrotóxicos, como as que compões a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida. De acordo com a entidade, o relatório que baseou a afirmação da Anvisa sobre o consumo aceitável de agrotóxicos apresenta “uma clara tentativa de ocultar os problemas causados pelos agrotóxicos no Brasil”.

Segundo nota divulgada pela Campanha, afirmar a lavagem de alimentos como possível solução é um perigo para a sociedade e demonstra um gravíssimo retrocesso no PARA e na Anvisa em geral. Quase todos os agrotóxicos possuem ação sistêmica, ou seja, operam por dentro e não na superfície dos vegetais. Ainda de acordo com a entidade, é o modelo do agronegócio que torna a agricultura brasileira insustentável e quimicamente dependente. “Sementes transgênicas degeneram nossa biodiversidade e levam ao uso de mais agrotóxicos, que por sua vez intoxicam quem planta e quem come”, de acordo com nota da Campanha.

O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) também publicou uma nota sobre a declaração da Anvisa. Segundo o Instituto, a orientação para higienização dos alimentos pode causar ao consumidor uma falsa impressão de segurança. De acordo com a ponderação do Idec, os resultados foram sistematizados de forma diferente de anos anteriores, o que dificulta a comparação dos dados. Em 2010, por exemplo, de acordo com o PARA, em 37% dos alimentos não foram encontrados resíduos de agrotóxicos. Esse número caiu para 22% em 2011 e depois voltou a 35% e 37% nas duas edições de 2012. Desde então, o consumo de agrotóxicos no Brasil subiu 11%, atingindo 914 mil toneladas em 2014. As intoxicações por defensivos agrícolas notificadas aumentaram em 17%, chegando a 4423 registros em 2014. Mas o novo relatório indica que apenas 1% destes alimentos representa risco agudo à saúde.

A Campanha Permanente contra os Agrotóxicos afirma também que o estudo não considerou os herbicidas glifosato e 2,4-D, que correspondem a mais da metade (56%) das substâncias usadas nas lavouras brasileiras, de acordo com dados do Ibama de 2014. Além disso, o número total de agrotóxicos testados diminuiu. Para cada cultura, a quantidade de amostras por ingrediente ativo é irregular. Por exemplo, para o arroz, 746 amostras foram testadas para o Tebuconazol, mas somente 247 para o Tiametoxam. De acordo com a Campanha, é muito difícil fazer afirmações estatísticas e tirar conclusões seguras. A conclusão de que apenas 1% dos alimentos analisado representa risco agudo à saúde oculta diversos outros riscos. O primeiro deles é das doenças crônicas, como câncer, depressão, suicídio, doença celíaca e outras que aparecem ao longo de muitos anos de exposição. Outra falha grave é desconsiderar a multiexposição, já que, como mostra o próprio relatório, uma grande parte das amostras apresenta mais de um agrotóxico. Não se sabe os efeitos disso para a saúde.

Questionada pela equipe de reportagem da FVHD, a assessoria de imprensa da Anvisa afirmou apenas que “a metodologia utilizada pela Anvisa é compatível com a de países de todo mundo e segue referência internacionais”. De acordo com o Idec, o estudo não parece ter sido feito para proteger a saúde das pessoas contra danos causados pelos agrotóxicos e sim um marketing do agronegócio. O Idec propõe estimular os modelos alternativos, como a agroecologia e a produção orgânica, como é proposto no Projeto de Lei que institui a Política Nacional de Redução do Uso de Agrotóxicos, entregue recentemente pela sociedade civil à Câmara dos Deputados.

Estudo – Iniciado em 2001, o programa PARA é coordenado pela Anvisa em conjunto com as vigilâncias sanitárias de estados e municípios e com os Laboratórios Centrais de Saúde Pública. O objetivo do programa é avaliar os níveis de resíduos de agrotóxicos nos alimentos que chegam aos consumidores.

Origem da data – No dia 3 de dezembro de 1984, um acidente industrial de grandes proporções em Bhopal, na Índia, acarretou o vazamento de 40 toneladas de gás tóxico metil isocianato, químico utilizado na elaboração de um praguicida da Corporación Union Carbide, em uma zona densamente povoada. A principal causa do desastre foi negligência com a segurança. Cerca de 30 mil pessoas morreram, 8 mil nos três primeiros dias. Aproximadamente 560 mil pessoas continuam com sequelas do acidente. Após a tragédia, a data foi estabelecida pela Pesticide Action Network (PAN) como o Dia Internacional de Luta Contra os Agrotóxicos.