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Quanto vale o meio ambiente?

Produção insustentável e mau uso do solo deixam as águas cristalinas e azuis de Bonito turvas e terrosas.

Apostar na produção agrícola a qualquer custo sai caro na conta de todos os brasileiros e, especialmente do meio ambiente. Isso não é novidade para ninguém, no entanto, mesmo com todos os números insustentáveis da produção de soja e cana em áreas preservadas, os agricultores continuam investindo na produção agrícola sem os cuidados necessários com o solo e a água. É o que está acontecendo em Mato Grosso do Sul, a 257km de Campo Grande, no município de Bonito. As águas azuis e cristalinas da região vão dando lugar a águas turvas e barrosas, um dos resultados da construção de um açude na fazenda do Rio Formoso. Localizada em área de preservação ambiental, a construção ainda não finalizada pretende usar a água do Rio Formoso no açude.

Segundo apuração do programa Fantástico no último domingo, drenos foram escavados por agricultores para escoar áreas alagadas, dando lugar ao plantio. O Ministério Público afirma que somente um agricultor possui 46 quilômetros de drenos em sua propriedade, sendo mais da metade sem licença ambiental. O produtor em questão foi multado em mais de R$ 10 milhões. Existe ainda uma discussão se a área seria ou não de preservação permanente, a chamada APP, mas o caso ainda corre na Justiça. Ainda foi apontado pela reportagem que novas estradas de terra abertas, algumas construídas na beira de rios, estão mais movimentadas. Elas também podem contribuir para o lamaçal que está virando as águas de Bonito.

DENÚNCIA – O que vem ocorrendo no Rio Formoso não é uma situação localizada e é muito mais grave do que pode parecer. As condições não só do Rio Formoso, mas de vários dos rios no entorno de Bonito são preocupantes. A cada chuva desce a lama junto. Especialistas afirmam que não é só uma, mas uma série de intervenções humanas que vêm ocorrendo na região e tem deixado esse cenário de devastação. O presidente do PV/MS, Marcelo de Moura Bluma, relata que todo esse processo de degradação que a região vem sofrendo começou com a extinção da Secretaria Estadual de Meio Ambiente, feita pelo então governador do PSDB, Renato Azambuja, eleito em 2014. “Ele é uma espécie de Blairo Maggi daqui”, pontua. A partir dessa extinção, os órgãos ambientais foram entregues aos “cuidados” da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Produção. Ou seja, entregou o comando dos órgãos ambientais para os ruralistas.

De acordo com Marcelo, essa política de desmonte dos controles ambientais vem ocorrendo a cinco anos e começa a mostrar os resultados. “O que está acontecendo em Bonito é apenas uma das consequências”. Outra questão é a contaminação do solo nos locais onde as usinas de álcool operam. Soma-se isso ao desmatamento acelerado da bacia hidrográfica do Pantanal. E todos esses problemas decorrentes do plantio de soja e cana de açúcar. É um ciclo vicioso de produção insustentável. Tudo indica, no entanto, que só a confluência de fatores explica a situação. “A denúncia mostra apenas uma parte do problema. Ainda falta uma denúncia do mesmo porte mostrando a contaminação do lençol freático que usinas de açúcar e álcool estão produzindo no Mato Grosso do Sul e o desmatamento na bacia do Rio Paraguai”, explica.

RISCO CRESCENTE – O que o programa Fantástico mostrou no último domingo já vem acontecendo a algum tempo, inclusive com protestos e denúncias da população, de ambientalistas e autoridades. Em novembro de 2018, o Rio da Prata, localizado na região de Bonito, ganhou um tom marrom-escuro. Naquele mês, segundo reportagem do UOL, a Polícia Ambiental do estado afirmou que a lama era oriunda do cultivo de soja da região. Após fortes chuvas, os sedimentos teriam escorrido até o rio. Inclusive, duas fazendas que não haviam feito barreiras de contenção adequadas, ambas suspeitas de serem responsáveis pela lama, foram notificadas.

A IMPORTÂNCIA DE ÓRGÃOS AMBIENTAIS – A proteção ambiental precisa caminhar em equilíbrio com a produção agropecuária. Ela serve para evitar os excessos e preservar a riqueza natural que é de todos. Por isso, a necessidade de uma Secretaria de Meio Ambiente, independente, com órgãos ambientais também independentes, que façam o contraponto à produção. Quando se pensa em produzir a todo custo, sem cuidados e sem o devido acompanhamento, o resultado é devastador. Foi isso que fez Reinaldo Azambuja quando extinguiu a Secretaria de Meio Ambiente e entregou o comando dos órgãos ambientais ao setor produtivo com carta branca para operar.
O que está acontecendo em Bonito, são os resultados dessa política inconsequente.

FALTA DE CUIDADO COM O SOLO – Propriedades adjacentes aos rios representam parte do problema. Quando não apresentam curvas de nível, a lama das propriedades desce e atinge os rios. Além disso, a estrutura das estradas também provoca, durante as chuvas, o desabamento de terra. Donos de duas propriedades rurais ao redor do Rio da Prata, no município de Bonito foram notificados pelo Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul) por não terem construído curvas de níveis durante o manejo do solo para o plantio de soja.

A falta de manejo correto nas propriedades e estradas não é, ainda assim, o único problema. Uma grande preocupação é a deterioração da mata ciliar, barreira natural para evitar a degradação do rio e ação direta das chuvas. Além disso, há, também, agressões aos banhados, territórios planos e pantanosos onde nascem os rios como o Prata e Formoso, com a incidência de lavouras.