Skip to content Skip to sidebar Skip to footer

“No Brasil, o fenômeno do desaparecimento e da extinção massiva de abelhas vem se registrando em praticamente todos os estados do país, sendo os pesticidas a principal causa”

Captura de Tela 2016-04-20 às 15.56.59

A produção e o abastecimento de alimentos no mundo está intimamente relacionado à continuidade das espécies de animais polinizadores, como abelhas, moscas e borboletas. Com o constante e abusivo uso de agrotóxicos nas plantações, mesmo àqueles considerados altamente nocivos e proibidos em muitos países, o desaparecimento e até mesmo a extinção desses animais tem sido frequente no mundo. No Brasil, o caso se complica um pouco mais já que os órgãos fiscalizadores aprovam o uso de pesticidas proibidos em outros países, como o neonicotinoide proibido nos Estados Unidos e na França a partir de setembro deste ano. Para esclarecer um pouco mais sobre a importância dos polinizadores para o meio ambiente de maneira geral e alertar para o fim do uso de pesticidas, a Fundação Verde entrevistou o coordenador da campanha Sem Abelha, sem alimento, o professor Dr. Lionel Segui Gonçalves.

Confira entrevista completa.

Fundação Verde – Além das abelhas quais outros insetos são polinizadores?

Professor Lionel: Abelhas em geral, vespas, dípteros (moscas), coleópteros (besouros), lepidópteros (borboletas). Ainda como polinizadores, porém, não insetos constam os pássaros (ex. beija-flores), morcegos, etc.

Fundação Verde – Quais benefícios esses animais trazem para o meio ambiente de maneira geral? Quais espécies agrícolas dependem para produzir mais da polinização ou mesmo são beneficiadas de alguma forma?

Professor Lionel – Colaboram na reprodução das plantas, aumento dos alimentos, aumento das áreas verdes, aumento do oxigênio, etc. A maioria das plantas produtoras de grãos e de frutas de interesse econômico são dependentes da polinização pelas abelhas tais como: melão, melancia, morango, abacate, maça, laranja, pera, coco, maracujá, algodão, milho, cebola, cenoura, girassol, nozes, canola, café, soja, trevo, alfafa etc

Fundação Verde – O que pode acontecer com os seres humanos com a extinção desses animais?

Professor Lionel – As abelhas são responsáveis pela polinização de 90% das plantas em geral e 70% dessas são utilizadas pelo homem para sua alimentação e dos animais. Portanto, a extinção dos mais importantes insetos polinizadores, as abelhas em geral, contribuirá com a redução ou extinção de maioria dos alimentos por falta de polinização, redução das áreas verdes, vegetações em geral, florestas, matas, campos e consequente redução do oxigênio necessário a sobrevivência de todos os seres vivos. Para o homem a redução dos alimentos causará inicialmente um sério impacto na redução da mão de obra com consequente aumento do desemprego em especial na agricultura como na agropecuária, com redução da produtividade, na variabilidade dos produtos, no aumento dos preços e abalo da economia, no aumento da fome e consequentemente no aumento das doenças por inanição e finalmente a morte dos animais e dos homens como consequência.

Além do indiscriminado uso de pesticidas, o declínio no número de colônias de abelhas vem se intensificando desde 2006 nos Estados Unidos, sendo que apenas no inverno de 2015 houve uma redução de 33,8% de colônias segundo o ARS (Agricultural Research Service) e pelo quarto ano consecutivo mais de um terço do total das colônias não sobreviveram ao inverno e outras causas como os pesticidas. Segundo Alison Benjamin “O mundo pode estar à beira de um desastre biológico após a notícia de que 1/3 das colônias de abelhas dos Estados Unidos não sobreviverão aos próximos invernos, conforme fonte: http://www.guardian.co.uk . No Brasil o fenômeno do desaparecimento das abelhas (CCD) e da extinção massiva de abelhas vem se registrando em praticamente todos os estados do país sendo os pesticidas a principal causa ,conforme constatamos em nossas pesquisas e na Campanha nacional de proteção às abelhas (site: www.semabelhasemalimento.com.br ) e no uso do aplicativo BEE ALERT (site: www.semabelhasemalimento.com.br/beealert ) no qual foram registradas em pouco mais de um ano, por apicultores, meliponicultores e pesquisadores a morte de milhares de colônias de abelhas em vários estados do Brasil, correspondendo a mais de 900 milhões de abelhas mortas principalmente devido a pesticidas. Somente em um lugar próximo a Fóz do Iguaçu-PR foi registrada recentemente a no aplicativo Bee Alert a morte de mais de 1.500 colonias de abelhas sem ferrão. Em vários municípios do Estado de São Paulo bem como em outros estados tem ocorrido mortandade de abelhas com seríssimos prejuízos aos apicultores. Por exemplo em Olimpia-SP, foi registrado em 2014 e 2015 num mesmo apiário no mínimo três ocorrências de morte de abelhas devido a pulverização de pesticidas por aviões, duas das quais testemunhadas por nós, tendo os apicultores da região manifestado suas intenções de encerrar suas atividades apícolas na região por falta de condições, tal o desamparo registrado por parte das autoridades da Secretaria da Agricultura ou do Mapa ou Ibama, ocorrendo um verdadeiro caos na apicultura.

Fundação Verde – O que tem levado à extinção dos polinizadores?

Professor Lionel: Um dos maiores eliminadores dos polinizadores são os pesticidas sistêmicos, os neonicotinoides, os ácaros ex Varroa destructor, os vírus associados aos ácaros, desnutrição, clima, e a destruição do meio ambiente pelo homem (devastação, poluição, uso de agrotóxicos e agroquímicos) etc. A presença de doenças causadas por bactérias, fungos, vírus, ácaros etc. Na Alemanha a venda dos pesticidas neonicotinoides está proibida há dois anos Em 17/3/2016 a União Nacional dos Apicultores da França aprovou em assembleia a interdição dos pesticidas neonicotinoides para ser aplicada a partir de 1o. de setembro de 2016.

Obs.- Gostaria de comentar que Mossoró-RN é um dos municípios maiores produtores de melão do Brasil sendo que aqui estão instaladas as mais importantes empresas produtoras e exportadoras de melão do país. A polinização da flor do melão depende totalmente das abelhas Apis melífera e como existem pragas no melão, são utilizados pesticidas altamente tóxicos às abelhas, em especial os pesticidas sistêmicos neonicotinoides. Os apicultores costumam alugar suas colônias de abelhas para polinizar o melão, sendo o preço do aluguel por colmeia em torno de 30 a 50 reais por colônia, por temporada. Com isso, as abelhas que não são mortas após visitarem as flores do melão, devido ao efeito altamente tóxico dos pesticidas, voltam muito enfraquecidas para as colmeias dos apicultores, fato que vem causando uma desistência gradual e cada vez maior dos apicultores. Como prova disso comento que recentemente foi defendida na UFERSA uma tese de doutorado por Idalecio Pacifico da Silva, do Depto. de Ciências Animais (trabalho publicado em Março de 2015 na revista Apidologie): “Pesticide exposure of honeybees (Apis melífera) pollinating melon crops “ realizado em uma das empresas meloneiras, tendo sido encontrados nas análises químicas de amostras de mel das colmeias utilizadas, 19 tipos de pesticidas, entre eles os acetamid, imidacloprid, parathion ethyl, paraxon e thiamethoxan etc que são dos pesticidas mais tóxicos aplicados, o que comprova o uso indiscriminado desses pesticidas nessa cultura.

Fundação Verde – Quantas espécies de abelhas existem no Brasil?

Professor Lionel: Aproximadamente 3.000 espécies de abelhas (vide Silveira et. al. 2002)

Fundação Verde – Alguma espécie brasileira está em risco de extinção?

Professor Lionel: Há várias espécies de animais e vegetais em extinção no Brasil. No entanto no que diz respeito às espécies de abelhas em risco ou em perigo de extinção no Brasil constam algumas relacionadas recentemente em Portaria No. 444 de 17/12/2014 da Ministra do Meio Ambiente, Isabella Teixeira, a saber:

632-Melipona (Michmelia) capixaba Moure & Camargo 1944 (Uruçu preta );
633-Melipona (Michmelia) rufiventris Lepeletier, 1836 ( Tujuba);
634-Melipona (Michmelia) scutelaris Latreille, 1811 (Uruçu);
635-Partamona litoralis Pedro & Camargo, 2003. (Partamona)
(Obs. Vide portaria do MMA No.444 de 17/12/2014)

Fundação Verde – É possível fazer o manejo de espécies de abelhas próximo às lavouras para aumentar a diversidade e a combinação com espécies selvagens?

Professor Lionel: É possível fazer o uso de espécies de abelhas próximo às culturas desde que sejam tomados os cuidados de não se colocar as espécies de abelhas na lavoura durante o período de aplicação dos pesticidas. Por outro lado, ao serem utilizados aviões para se aplicar pesticidas, pela lei os apicultores deveriam ser avisados pelo responsável pela aplicação com antecipação de 48 horas antes para que as colmeias sejam retiradas das lavouras ou culturas, porém de maneira geral isso não é feito.

Fundação Verde – Quais outras soluções são viáveis para que tanto a população quanto os agricultores tomem para diminuir a chance da extinção dos polinizadores?

Professor Lionel: Uma das principais é não usar indiscriminadamente os pesticidas, preservar o meio ambiente e incentivar as empresas a partirem para o combate a pragas com controle biológico e não com pesticidas.

Segundo uma orientação dada aos agricultores franceses e divulgado pela France Press, os cinco passos para serem salvas as abelhas da morte ou do desaparecimento são: plantar mais arbustos e árvores ricas em flores, néctar e pólen; deixar trechos de terra livre de culturas para o crescimento de plantas silvestres ou nativas; aparar a grama com menos frequência; evitar de perturbar ou destruir insetos aninhados ou em hibernação e pensar cuidadosamente antes de usar os pesticidas. Eu particularmente sugiro eliminar os pesticidas e usar em seu lugar controle biológico.