A história de uma criança de apenas 10 anos grávida por estupro no Espírito Santo chamou a atenção do Brasil nos últimos dias. Alguns se solidarizaram com a menina, estuprada desde os 6 anos de idade, com sua dor e vulnerabilidade. Mas existiram aqueles que pouco deram importância a isso, ao estupro em si. Apenas se ligaram ao fato de que a criança faria um aborto legal para poupar a própria vida.
Essas mesmas pessoas que se escandalizaram com o direito de crianças e mulheres fazerem aborto em casos de gravidez por estupro, que chegaram ao ponto de tentar invadir um hospital, não se escandalizam com a gravidade da situação no Brasil? Para elas, estupros são normais?
Segundo o Anuário de Segurança Pública de 2019, em 2018 foram registrados 66.041 casos de violência sexual no Brasil, o maior índice já registrado. Foram 180 estupros por dia. Um crescimento de 4,1% em relação ao ano anterior. Aqui devemos ressaltar que esses números referem-se apenas aos notificados e que há, sim, uma grande subnotificação, um silenciamento, seja por cumplicidade, seja por medo ou vergonha.
E quem são as vítimas dessa violência sexual? Os dados assustam, chocam, entristecem. Ao todo, 81,8% são do sexo feminino e 53,8% tinham até 13 anos de idade. Um total de quatro meninas de até 13 anos estupradas por hora no Brasil. Os dados também mostram que 50,9% eram negras e 48,5%, brancas.
Uma das formas de denunciar abuso de crianças no país, o Disque 100, segundo reportagem da Folha de São Paulo desta segunda-feira (24 de agosto de 2020), vem passando por um desmonte durante o atual governo: “Disque 100 omite encaminhamento devido a mais de 86 mil denúncias recebidas em 2019”.
“A questão é que não se sabe que encaminhamento foi dado às denúncias recebidas – nem mesmo se alguma providência foi tomada. Questionado pela Folha, o ministério [da Mulher, da Família e de Direitos Humanos] respondeu que a exclusão desses dados foi uma ‘decisão editorial’, mas que todas as denúncias recebidas são encaminhadas”, diz, ainda, o veículo de comunicação.
O que podemos nos perguntar é o que os governos em todas as esferas de poder podem, devem ou deveriam estar fazendo e não fazem para proteger essas crianças. Falta preparo, consciência, trabalhos educacionais e de conscientização, proteção… Sim, o Brasil tem falhado com suas crianças. Nós, cidadãos, temos falhado. Ninguém pode achar normal uma criança ser violada, violentada de qualquer forma, muito menos estuprada. As pessoas não podem pôr religião e fanatismo acima do amor. E quem se cala, quem não denuncia, também é um estuprador em potencial, é conivente, é parte dessa dor e vergonha.
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