Na última sexta-feira (28/8) representantes políticos, pesquisadores e gestores reuniram-se em mais uma edição do Diálogo Brasil: Reflexões sobre a crise e os caminhos democráticos, dessa vez em Belém, capital paraense. Promovido pelas fundações partidárias Verde Herbert Daniel (PV), João Mangabeira (PSB) e Astrogildo Pereira (PPS), o evento teve como tema Sustentabilidade e Desenvolvimento Humano. Para debater a problemática do tema e possíveis soluções, foram apresentados exemplos de boa gestão, como o prefeito de Vitória/ES Luciano Rezende, mostrando que com total transparência, participação da sociedade e uma comunicação integrada, conseguiu reduzir a taxa de homicídios para dois em 2015, representando o menor número em 32 anos.
José Carlos Lima, presidente da Fundação Verde Herbert Daniel (FVHD), foi o mediador do debate e contextualizou os inúmeros problemas que a região norte vive em termos de desenvolvimento humano e sustentável. “As cidades amazônicas hoje são extremamente violentas, principalmente as que ficam próximas a grandes investimentos e projetos de mineração.” Segundo José Carlos, com as pastagens, as grandes plantações de soja, as hidrelétricas e as mineradoras com seus imensos projetos de mineração, atividades baseadas na falta de preservação, fazem com que a região sofra cada vez mais os efeitos das mudanças climáticas e da falta de governabilidade.
Abrindo o ciclo de debates, Philip Fearnside, climatologista e também pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA/MCT), iniciou sua fala afirmando que, para ser considerado um desenvolvimento sustentável, é preciso apresentar algum tipo de progresso que seja duradouro. “Hoje quase toda a economia é baseada na destruição e deveria ser baseada na manutenção”, salientou. Para contextualizar sua afirmação, Philip levou dados de sua pesquisa, “O desenvolvimento sustentável frente a preservação do bioma Amazônia e os eventos de mudanças climáticas”. De acordo com Philip, a Amazônia tem um papel fundamental no desmatamento e nas mudanças climáticas e sua preservação geraria inúmeros benefícios para toda a sociedade. No entanto, “o que se vê hoje é uma emissão de 10 bilhões de toneladas por ano de carbono por causa do desmatamento”.
Ainda segundo o pesquisador, quanto mais aquecimento global, mais fenômenos como o El Niño ocorrerão. Philip Fearnside recebeu o Prêmio Chico Mendes e em 2015, foi o cientista mais citado de todos os cientistas do mundo, como referência em aquecimento global.
Dando um exemplo de gestão, o prefeito de Vitória/ES, Luciano Rezende (PPS/ES), mostrou como conseguiu reduzir a taxa de homicídios em sua cidade. Segundo Luciano, a participação da sociedade é fundamental para qualquer mudança.
“Resolvemos fazer um governo horizontal e conectado com a população no que chamamos de gestão compartilhada”, explicou. Para tanto, o prefeito utilizou-se do diálogo usando inúmeras ferramentas de interação, como as redes sociais e, inclusive, o whatstapp, que é compartilhado para toda a cidade. A população interage fazendo denúncias em tempo real.
Segundo Luciano, a crise política no Brasil abala também aos gestores de estados e municípios, que vêm a população desacreditada da política de uma maneira geral. “O que fiz foi uma grande tentativa de puxar a crise nacional para o poder local e contribuir com um outro ângulo de visão”, afirmou. Crises sem solução geram um problema de credibilidade e reputação e foi a partir dessa percepção que a prefeitura de Vitória deu início a mudança na forma de governar a cidade. Até agora, 2015 apresentou a menor taxa de homicídios em 32 anos, apenas dois.
Dando continuidade ao ciclo de debates, a doutora em Desenvolvimento Sustentável, Maria Amélia Enriquez, afirmou que o estado do Pará é uma síntese do que acontece com a Amazônia e isso tem a ver com o processo de crescimento e opção de desenvolvimento brasileiro. Para exemplificar, a pesquisadora apresentou alguns entraves causados pela mineração e os efeitos danosos que a atividade causa em toda a região do Pará, afetando inclusive, sua população. Em recente visita ao Xingu, a pesquisadora afirmou que a taxa de pobreza aferida naquela região é de cerca de 40% e o índice de analfabetismo de regiões próximas é de 30 a 40%.
Segundo Maria Amélia, apesar de ter sido criado um Plano de Desenvolvimento para o Xingu que tenta conciliar os diferentes segmentos da sociedade civil, dos governos federais, municipais e do Estado, “um dos grandes problemas daquela região é a formação de um consenso coletivo e aquilo que é estratégico para o desenvolvimento da região”. Apesar de ter sido averiguado que a falta de conectividade é um problema estratégico para a comunicação em todos os segmentos, esse tema não entra nas discussões individuais que ocorrem em cada região. “É muito difícil definir o que é mais urgente: o estratégico ou o estruturante. A população deseja aquilo que é mais imediato para sua cidade, principalmente por terem recursos limitados. Ela vai preferir o asfaltamento de uma estrada do que a implementação de uma rede de internet, que inclusive é de alto custo nessa região”, explicou.
Com uma fala mais geral sobre a crise política e econômica do Brasil, Carlos Edilson Maneschy, reitor da Universidade Federal do Pará (UFPA), foi o último palestrante e afirmou que, a partir dessa crise “pode nascer a força que falta para mudar o país”. De acordo com Carlos, houve grandes avanços na realidade brasileira, como o aumento no acesso à educação superior e a universalização do ensino fundamental, no entanto, “é preciso pensar em um novo modelo de desenvolvimento social e com esse tipo de diálogo é possível construir um Brasil democrático”. Ainda segundo Carlos, o modelo de exploração atual remonta o modelo Brasil-Colônia. “Primeiro foi a exploração da borracha, depois a invasão da pecuária, a exploração do minério, depois da energia e amanhã provavelmente será a água. O resultado deste modelo se mostra completamente incompatível com nossas necessidades”, finalizou.
Diálogo Brasil – Essa foi a quinta edição do Diálogo Brasil: Reflexões sobre a crise e os caminhos democráticos, finalizando o ciclo de debates que tinha como objetivo percorrer as cinco regiões do Brasil apenas no primeiro semestre. A primeira edição do evento ocorreu em Brasília, seguida de São Paulo, no qual foi abordado as manifestações de rua deste ano. O terceiro estado que recebeu o evento foi o Rio Grande do sul e o tema foi a crise a nível internacional que o Brasil vive atualmente; o quarto estado contemplado foi o Recife, no qual foram debatidos problemas internos da região nordeste e, para finalizar o debate nas cinco regiões a cidade de Belém, focando no desenvolvimento humano e sustentável da região norte.
Estiveram presentes no debate José Luiz Penna (PV/SP), deputado federal e presidente do Partido Verde (PV), Arnaldo Jordy (PPS/PA) e Renato Casagrande, presidente da Fundação João Mangabeira.