Seminário na Câmara dos Deputados debateu o uso de energias renováveis no Brasil e um novo modelo de mercado de energia, o mercado livre.
O Seminário “O Novo Prosumidor – um debate sobre geração distribuída, energias renováveis, eficiência energética e portabilidade da conta de luz no contexto da economia de baixo carbono”, ocorrido na última quarta-feira (9), na Câmara dos Deputados, em Brasília, levantou o debate sobre o Projeto de Lei 1917/15 que trata da portabilidade das contas de luz, na qual o consumidor poderá escolher o fornecedor de quem irá comprar energia, no chamado mercado livre. Na ocasião, parlamentares, membros do Governo Federal e empresas como a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Abrasolar), Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) e Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) também apresentaram dados mostrando a potencialidade do Brasil para o uso em maior escala de energias renováveis, como a solar e eólica, estabalecendo ao setor energético a meta estipulada no Acordo de Paris de que até 2030 o uso de energias limpas no Brasil seja de 45% do total.
No primeiro momento do debate, o relator na Comissão de Minas e Energia do PL 1917/15, o deputado Fábio Garcia (PSD/MT) explicou que, se a proposta for aprovada, o consumidor vai poder escolher o fornecedor de quem compra a energia. “Hoje ele é obrigado a comprar da distribuidora de seu estado, ele não tem a opção de comprar de qualquer outro comercializador de energia elétrica no Brasil”, afirmou.
De acordo com o deputado, o projeto busca abrir esse mercado e possibilitar, como ocorre na telefonia, que o consumidor possa escolher, no setor elétrico, entre os distintos operadores. Porém, segundo Garcia, é necessário um tempo de transição para abrir 100% do mercado. Em um primeiro momento, o projeto reduz as exigências para que os grandes consumidores, em geral indústrias, comprem energia livremente. No entanto, o objetivo da proposta é abrir gradualmente esse mercado para que, a partir de 2022, também o consumidor comum possa escolher de quem comprar, em um sistema de abertura total.
Fábio acrescentou que é preciso discutir como ficariam os subsídios do setor. “O consumidor paga subsídios do setor elétrico e de políticas sociais de governo, precisamos discutir como serão pagos entre os consumidores livres e os cativos, regulados”, avaliou.
O debate foi proposto pelo deputado Antonio Carlos Mendes Thame (PV/SP), coordenador da Frente Parlamentar Mista em Defesa das Energias Renováveis, Eficiência Energética e Portabilidade da Conta de Luz e realizado em parceria com o Comitê de Gestão Socioambiental da Câmara dos Deputados (EcoCâmara) e com a Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel). O parlamentar lembrou dos PLs que tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado Federal e afirmou que ambos, além de promoverem alterações no modelo comercial do setor elétrico, asseguram a portabilidade da conta de luz a todos os brasileiros a partir de 2023. “Além do inalienável direito de escolha do seu fornecedor de energia, as mudanças propostas incentivam o uso de fontes renováveis de energia e criam uma nova figura no setor elétrico: o “prosumidor”, isto é, o consumidor que produz a sua própria de luz”, ressaltou Thame.
O secretário de Energia Elétrica do Ministério de Minas e Energia (MME), Fabio Alves, mostrou preocupação quanto ao respeito aos contratos em vigor. O secretário observou que diferentemente da telefonia, por exemplo, na energia, mesmo que o consumidor faça a opção pelo mercado livre, ele continuará conectado a uma determinada rede. Assim, a portabilidade na conta de luz não mudaria a qualidade do serviço. Porém, a possibilidade de negociar com a distribuidora poderia, na sua visão, levar a preços melhores. De acordo com Fabio, do ponto de vista legal, o mercado já pode ser livre desde 2003. “Temos que ver como sair de um modelo para o outro sem ninguém morrer afogado no caminho”, disse. Os contratos atuais não podem ser “rasgados”, alertou. Completando sua preocupação, Fabio indagou, “como ficam esses contratos na hora em que o consumidor sai da distribuidora e vai para o mercado livre? Quem vai arcar com essa diferença? São coisas que têm que ser respondidas, e o governo está trabalhando nisso”.
No segundo momento do seminário, o presidente executivo da Abraceel, Reginaldo Medeiros, também defendeu o mercado livre de energia, que já é acessível apenas a grandes empresas (com demanda maior ou igual a 3 megawatts). De acordo com Reginaldo, esses grandes consumidores teriam tido, desde 2003, redução nos custos de energia. Segundo Medeiros, se depender dos grandes distribuidores, não haverá mercado aberto para todos no Brasil. “O setor elétrico tradicional vai tentar manter o mercado como está para continuar repassando custos para o consumidor”, opinou.
Segundo ele, todos os países da União Europeia têm mercado de energia aberta desde 2007. Já nos Estados Unidos, alguns estados têm e outros não. Ele afirmou que nos locais onde houve abertura o preço da tarifa caiu. O presidente mostrou em sua explanação que o Brasil está ficando para trás em relação à portabilidade das contas de luz, o que, em outras palavras, significa expansão do mercado livre.
Hoje, no País, 27,4% do consumo de energia (16,2 MWm) estão dentro do mercado livre, mas isto não representa muita coisa quando se compara a situação do Brasil com a de outros países. Na Colômbia e El Salvador, por exemplo, todos os consumidores são livres para escolher o supridor de energia elétrica.
“Por que alguns países abriram seus mercados?”, indagou Reginaldo. De acordo com ele, a resposta é porque os governos e os reguladores optaram pela competição. No seu entendimento, não se justifica a enorme resistência que existe no Brasil quanto à eventual ampliação do ML. “Temos muita reação no Brasil a um modelo que faz sucesso no mundo inteiro, que avançou nessa direção. Segundo uma pesquisa que a Abraceel contratou junto ao Ibope, 73% dos brasileiros querem escolher os fornecedores da energia.
No Congresso, dois projetos estabelecem cronogramas de abertura do mercado brasileiro de energia elétrica: o PL 1917, da Câmara dos Deputados, e o PLS 232, do Senado Federal. Para o presidente da Abraceel, o País deveria aprofundar as discussões para alterar radicalmente o modelo e aumentar a participação do ML. A vontade política, entretanto, esbarra nas restrições técnicas da expansão da geração.
A vice-presidente da CCEE, Solange David, entende que existe uma falta de visão quanto à eficiência do mercado livre, o que estaria na raiz da briga entre os defensores e adversários do ML. Enquanto o mercado regulado sustenta a expansão, Solange enxerga pequenas atitudes que já levam à migração de muitos consumidores do ACR para o ACL, principalmente porque os grandes consumidores estão interessadíssimos em diminuir os custos das suas contas de luz. No final de outubro, por exemplo, a CCEE alcançou o recorde absoluto de contar com 5.100 agentes no seu quadro.
“Há um grande potencial de expansão. Mas temos que definir uma estrutura. É um avanço que precisará ser estruturado. Inclusive os consumidores precisarão também conhecer as obrigações existentes no mercado livre”, afirmou.