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Hidrelétricas, o pesadelo dos índios e da biodiversidade

Mais uma vez a população indígena está à mercê das decisões do governo sobre áreas habitadas por eles e que até o momento não foram demarcadas pelos órgãos responsáveis. A área indígena Sawré Muybu, no rio Tapajós e habitada pelos Munduruku, terá cerca de 178 hectares alagados para a construção de um complexo de hidrelétricas. O rio Tapajós é um dos poucos com potencial energético ainda inexplorado no Brasil.

Entre os principais empreendimentos previstos cujos projetos contam com a participação da estatal Eletrobras e mais sete empresas, estão os das hidrelétricas de Jatobá e de São Luiz de Tapajós, próximo ao município de Itaibuna (PA). Este último prevê uma geração de até 8 mil MegaWattz (MW), com o alagamento de uma área total de 729 quilômetros quadrados após a construção do reservatório, extensão maior do que a cidade de Salvador.

De acordo com o Greenpeace, quatro lagoas sazonais e perenes, mais de 7 mil hectares de pedrais (áreas com pedras nos rios importantes por abrigar diversas espécies de peixes, morcegos e aves), 320 ilhas e 17 corredeiras desapareceriam caso a usina seja construída. Cerca de 370 km2 de florestas seriam inundados.

Cercado de polêmicas em sua construção, o empreendimento deve se estender a ponto de alagar áreas de Unidades de Conservação Permanente (UCPs), como o Parque Nacional da Amazônia, o que é vetado pela Constituição. No entanto, para tentar driblar o problema o governo emitiu uma Medida Provisória alterando a área de diversas UCP’s, que foi aprovada pelo Congresso Nacional em 2012, apesar de críticas de órgãos como o Instituto Chico Mendes de Conservação Ambiental (ICMbio).
Na véspera das comemorações pelo Dia Internacional da Floresta (21/3), cerca de 100 índios da etnia Munduruku coordenados pela Organização Não Governamental (ONG), Greenpeace, protestaram em um trecho do Rio Tapajós considerado sagrado pelo povo, contra a possível construção do complexo de hidrelétricas no rio.

Impacto Ambiental – De acordo com a análise encomendada pelo Greenpeace sobre o Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) da usina hidrelétrica de São Luiz do Tapajós, concluiu-se que faltam informações essenciais, além de indicarem lacunas nas amostras coletadas e classificarem os programas de compensação propostos como genéricos e insuficientes. O material, assinado por cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) do Museu Paraense Emílio Goeldi e da Universidade Federal de Pernambuco, concluiu que o estudo falha em seu principal objetivo: prever o impacto da obra sobre uma das regiões de floresta mais preservadas do Brasil.

Para Philip Fearnside, um dos cientistas do INPA que assina a análise divulgada pelo Greenpeace, uma das principais lacunas do EIA/Rima de São Luiz se refere aos povos da região. Ele diz que o estudo minimiza ou até nega impactos futuros da obra sobre índios e ribeirinhos – estima-se que 12 mil índios munduruku e 2,5 mil ribeirinhos serão afetados pela usina.

“O estudo diz que a hidrelétrica não reduzirá os peixes do Tapajós, mas isso é muito duvidoso, porque houve grande impacto em outras barragens – em Tucuruí, por exemplo, a usina acabou com a pesca”, diz Fearnside, que estuda há 30 anos os impactos da ação humana na Amazônia.

A Eletrobras entregou o EIA/Rima ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) em agosto de 2014, em busca da primeira autorização para a obra. Em uma primeira avaliação o Ibama identificou “inconsistências” e pediu complementos ao trabalho. O projeto, que ainda em fase de licenciamento ambiental, possui limitações técnicas e metodológicas, e os cientistas apontam falta de amostras de campo abaixo do local da obra (região que não será alagada mas deverá sofrer com falta d’água), ausência de dados sobre espécies de ambientes ripários (margens de rios, ilhas e pedrais) e inexistência de projeção sobre o impacto conjunto das usinas previstas para outros pontos do Tapajós.

Beleza pouco explorada – O Rio Tapajós atravessa o oeste do Pará por 800 km até o rio Amazonas, em Santarém (PA). Ele e seus afluentes formam uma região ainda pouco impactada pelo homem – são menos de um milhão de pessoas em 50 milhões de hectares. De acordo com a avaliação do Greenpeace, a biodiversidade no rio Tapajós é imensa e conta com: 1.457 plantas, 553 aves, 352 peixes, 302 borboletas, 109 anfíbios e 95 mamíferos.