O Informe 2021/2022, divulgado em 29 de março, aponta violações de direitos humanos, devastação do meio ambiente e má-gestão da pandemia no Brasil
A Anistia Internacional divulgou no dia 29 de março o Informe 2021/2022 com a análise de estudos realizados em 154 países baseando-se em três eixos: saúde e desigualdades, espaço cívico e rejeição a refugiados e migrantes nos países do hemisfério Norte.
O documento de 134 páginas traz um panorama regional por continente, abrangendo os cinco continentes, e análises individuais de 20 países, incluindo o Brasil. A secretária-geral da Anistia Internacional, Agnès Callamard, inicia o prefácio com três perguntas.
“Como ficaram as pessoas, em meio às disputas políticas de poder que marcaram o ano de 2021? Os direitos se mantiveram no contexto da caótica concorrência mundial por lucro, privilégios e prestígio? Os titulares de direitos foram mais considerados, respeitados e protegidos enquanto a pandemia de Covid-19 se arrastava e os conflitos se agravavam?”
Agnès Callamard
No tocante ao Brasil, os dados analisados pela ONG são desanimadores. Houve má-gestão da pandemia, crescimento da instabilidade política e da crise econômica, aumento da violência contra grupos minorizados, perdas irrecuperáveis de ecossistemas, regressão de direitos dos povos originários, aprovação do uso de milhares de agrotóxicos e um sério retrocesso ambiental.
A má-gestão da pandemia
A inação do governo de Jair Bolsonaro em relação à compra de vacinas contra a Covid-19 e seu subsídio à desinformação e ao negacionismo comprometeram seriamente a gestão da pandemia. Mais de 650 mil brasileiros morreram de Covid-19 e estima-se que mais de 120 mil mortes poderiam ter sido evitadas se o governo tivesse providenciado vacinas na época certa.
A crise sanitária associada a desemprego, repressão policial, devastação do meio ambiente, agressões aos que defendem os direitos humanos, ataques a jornalistas e organizações da sociedade civil, aumento do número de mortes da população LGBTQIA+ e milhares de mortes por Covid-19 que poderiam ter sido evitadas acirraram a violência, a miséria, a insegurança alimentar, a falta de moradia e saneamento, a precariedade e o retrocesso de leis ambientais.
A insegurança alimentar
Nesse contexto, a crise e a instabilidade econômica, política e social comprometeram os direitos humanos da população. A insegurança alimentar teve um salto de 54% desde 2018 e a fome (insegurança alimentar extrema) afetou 19 milhões de brasileiros, em especial nas famílias chefiadas por mulheres negras.
Entre março de 2020 e outubro de 2021, no auge da pandemia, mais de 23 mil famílias foram despejadas das casas onde moravam. Cerca de 100 milhões de brasileiros não tinham coleta de esgoto e 35 milhões não tinham acesso à água potável.
Os ataques a grupos minorizados
Os direitos dos povos originários vêm sendo constantemente ameaçados, vide a tese do Marco Temporal que estabelece que as populações indígenas só podem reivindicar terras que ocupavam na data da promulgação da Constituição de 1988.
Com os constantes ataques do presidente Jair Bolsonaro e a diminuição da fiscalização das atividades ilegais em terras indígenas, também é crescente a violência contra a população indígena. O número de pessoas assassinadas em função do gênero mantém o Brasil em primeiro lugar no mundo com 125 assassinatos entre outubro de 2020 e setembro de 2021.
As centenas de novas liberações de agrotóxicos desde 2016 e a apropriação ilegal de terras por garimpeiros, madeireiros e agropecuaristas, muitas vezes em área de reserva, têm devastado o meio ambiente, contaminado água e solo e comprometido seriamente a saúde das pessoas e dos animais.
O assassinato do meio ambiente e de quem o defende
A devastação de biomas é outro ponto presente no relatório da Anistia Internacional. Incêndios e desmatamento são duas sérias ameaças para a Floresta Amazônica. Entre janeiro e dezembro de 2021, foram desmatados mais de 10 mil km² da floresta. Um aumento de 29% em relação a 2020.
O Brasil também não é um país seguro para líderes e defensores do meio ambiente e do direito à terra. O país se encontra no quarto lugar em número de assassinatos de líderes ambientais e defensores do direito à terra.
Em janeiro de 2021, Fernando dos Santos Araújo, trabalhador rural e ativista pelo direito à terra, foi assassinado no Pará. Ele sobreviveu ao massacre de Pau D’Arco, município paraense, em maio de 2017 e era uma das principais testemunhas do crime em que dez ativistas foram assassinados por policiais.
Em maio de 2021, o ativista das causas de gênero e diversidade sexual do MST, Lindolfo Kosmaski, foi encontrado morto a tiros em um carro incendiado no Paraná.
O aumento da precariedade e da vulnerabilidade econômica
Outro aspecto que vem dificultando a vida de milhões de brasileiros é a crise econômica e social, que tem tornado suas condições de vida mais precárias. As parcelas minorizadas da população ficaram ainda mais vulneráveis, carentes de serviços essenciais como água potável e esgoto.
“A pobreza crescente, a insegurança alimentar e a instrumentalização da pandemia pelos governos para reprimir as divergências e as contestações foram todas cultivadas em 2021 e regadas e fertilizadas pelo nacionalismo vacinal e pela ganância dos países mais ricos.”
Agnès Callamard
Por Caroline Cardoso – Comunicação FVHD
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